Colégio interno! Vocês não sabem como é difícil para uma criança, sensível como eu, ficar isolado de sua família, de sua fonte de afeto! A cabeça começa a entrar em pensamentos obsessivos, doentios. Eu buscava os motivos daquela prisão. Perguntava pra mim mesmo : -“o que fiz de errado? “Porque estou sendo punido “? A consciência vai desenvolvendo defesas pra nos proteger do inimigo oculto. Sim, oculto! Não podia imaginar que minha mãe me desejasse tanto sofrimento. Seria insano pensar isso! Logo ela por quem eu sentia um desejo tão grande de estar próximo. De sentir seu cheiro tão gostoso! Seu hálito morno!” SUA PRESENÇA TÃO FORTE”! Não eu não podia pensar dessa forma. Tentava me convencer que forças maiores fizeram com que ela me prendesse, lá! Pensei muito. Na minha loucura concluí que foi , “DEUS”! Talvez “ELE” achasse que seria bom para mim. Ela sempre falava do grande poder e sabedoria que ” ELE” tinha! Fiquei nesses intensos conflitos, dias e noites seguidos. O que me aliviava, de vez em quando, eram os momentos de esportes que a gente praticava. Lá eu soltava parte da raiva contida ! Mas o alívio era rápido, à noite tudo voltava novamente. Isso virou um ciclo vicioso em minha vida! Não dava mais pra aguentar! Lembro que quando chegava as férias de fim de ano, eu me sentia como um passarinho solto da gaiola. Feliz, mas com muito medo de voar. Numa dessas férias, quando já fazia quatro anos de “cárcere”, resolvi que não voltaria nunca mais pra lá! Enquanto estive em casa naquelas férias, não contei meu plano à ninguém. Quando foi chegando a hora da volta, foi batendo o desespero! Não é possível que minha mãe não percebesse.Ela me conhecia tão bem! No dia do regresso ela me deu o beijo frio de sempre! Recomendou juízo e cuidado! Colocou eu e a minha prima no ônibus que iria nos levar para o interior, onde era o internato. Ela desceria na metade do caminho. Essa prima tinha a mesma idade que eu! Estava indo numa festa na casa de uma tia nossa. Era aniversário dela! Não fui convidado! Havia uma comunicação não verbal me impedindo de expressar a enorme tristeza que eu estava sentindo.! Ninguém sabia que a minha decisão já estava tomada! Na hora em que Carla foi descer do ônibus, eu, num impulso, desci também ! Fui procurar viver a minha festa! Me enchi de coragem! Voltei para casa de meus pais, novamente. Agora com menos algemas mentais! Estava no auge dos hormônios e dos sonhos! Rasquei o coração! Chorei muito! Falei de todas as dores contidas! Da enorme solidão e angústia que eu sofria naquele lugar. Para surpresa minha recebi um enorme abraço e acolhimento de minha mãe. Conheci o mel que estava escondido atrás do beijo frio! Nunca mais fugi de mim!
Mês: novembro 2018
QUERIA TE FALAR! (PRECONCEITO)
Estou numa confusão danada. Já nem sei ao certo por onde devo começar ! Estou apaixonada ou não? Tudo começou tão natural. A nossa história é muito antiga, somos amigos há tanto tempo! Tenho a impressão de que a gente se conhece de outras vidas. Lembra quando tínhamos oito anos? Naquele tempo era só brincadeira e diversão. Você vivia me dizendo que era mais velho que eu, imagina, só vinte dias de diferença. Só você mesmo! A gente ria de tudo, simplesmente. E aquela vez na igreja quando eu tive um ataque de riso? Não conseguia parar de rir, era mais forte que eu! Todas as pessoas olhando com censura! Lembro também, que sua mãe era muito chata, ela não falava, gritava… Hoje eu entendo! Era uma pessoa muito nervosa, descontrolada; também pudera, ter que viver com aquele babaca de seu pai. Galinha e mulherengo! Para ele, qualquer rabo de saia servia. Pensando bem, a dona Glória, sua mãe, era uma coitada, acho que nunca foi feliz! Sempre mal cuidada, trazendo uma imagem de sofrimento! Não tinha vaidade nenhuma! Pior ainda quando seu pai começou a se embriagar, de ficar caído na rua! Você queria se esconder daquilo tudo. Morria de vergonha! Sabe, eu era pequena mas percebia toda a sua aflição! Muitas vezes sentia vontade de te alegrar e, na minha cabeça, se eu te desse o meu álbum de figurinhas você ficaria feliz. Foi o que eu fiz num domingo de sol,quando a gente foi andar de bicicleta. Lembra? Naquele domingo eu também, estava muito triste. Minha mãe informou que estava se separando de meu pai. A gente iria mudar para outra cidade. Quando te contei, choramos juntos! Não teve jeito, quinze dias depois eu já estava morando na casa de minha avó. No começo da nossa separação, tudo foi difícil. Além de me separar do meu pai, que sempre foi legal comigo, perdi também o meu querido amigo! Sofri muito! Com o passar do tempo, como é natural, fui me adaptando à nova realidade. Nova escola, novos amigos, mas ninguém tão especial como você! Hoje, passados quase nove anos, quis o destino que a gente se cruzasse, naquele encontro de estudantes, no mês passado. Fiquei muito surpresa e feliz! Você não mudou quase nada, só cresceu. E lindo! Você também me reconheceu imediatamente. Achei incrível. A gente não se falava e nem se via há tanto tempo! Conversamos, matamos saudades e combinamos de manter contato, apesar de ainda morarmos em cidades diferentes. Desde aquele dia, fiquei muito mexida emocionalmente! Tem algo dentro de mim, muito forte, que está me assustando. Não paro de pensar em você! Nem dormir direito estou conseguindo. Me pergunto o que é isso. Tem vindo uma resposta que me excita mas que tento rejeitar! Resolvi te escrever e encarar essa situação de angústia e conflito intenso. PODEMOS CONVERSAR?
EU REINVENTEI UM AMOR! (IDEALIZAÇÃO)
A porta bateu! Bateu tão forte, tão de-repente! Naquele domingo chuvoso, depois de um lauto café da manhã, depois de momentos deliciosos, começou do nada uma discussão sem fim… Me dei conta que estava aos berros, tentando me defender da enorme agressividade do homem que sempre chamei de ” MEU AMOR”! Quando conheci André, há uns sete anos atrás, tudo era encantamento. Seus olhos azuis, sorridentes, continham um mistério dos céus! Nossa atração foi mútua e muito forte. Adorava seu cheiro, a sua barba me roçando o pescoço, meu corpo todo. Era um arrepio só! A gente tinha altos momentos de um incrível tesão. As nossas peles se conversavam! Infelizmente, a rotina da vida envolve questões muito práticas e, algumas vezes cansativas demais. Mudanças na nossa relação foram acontecendo gradativamente, só percebi quando foi se evidenciando em André, um humor ácido, crítico e egoísta. Se revelou uma pessoa de uma intolerância absurda em que eu não o reconhecia mais. Dentro do meu peito foram acontecendo abruptas alterações. Já não suportava mais que ele se aproximasse de mim. Só conseguia sentir fragmentos daquele amor! O meu coração igual uma pedra, parecia que nem pulsava mais. Fui ficando assustada e infeliz! O meu marido se tornou um irmão chato e mesquinho. A separação foi inevitável! Foi um momento muito difícil, avassalador! Com uma sensação profunda de solidão, depois de estar solteira há dois meses, assim como uma louca, resolvi inventar um amor. Era noite do “dia dos namorados”! Estava tomando um café quente e bem forte, sentada na varanda da minha nova casa, me sentindo abandonada na vida. Surgiu a ideia reconfortante de inventar um amor! Entrei nesse devaneio e fui dando formas ao meu novo projeto. Construí antes de tudo o caráter. Depois fui montando em minha mente, o perfil físico e por último coloquei a expressão que sonhava que esse novo amor devia ter. Fiquei assim por quase duas horas. Já quase terminando o meu café, nesta altura gelado, busquei visualizar a imagem produzida pelo meu desejo. UAU!!! Me deu aquele arrepio antigo, tão conhecido. Pulei da cadeira! ERA O ANDRÉ! Com um olhar um tanto triste, choroso, mas ainda com seus mistérios. Meu coração se derreteu e chorou! Como assim? Fiquei meditando muito sobre isso. Toda essa experiência fez com que eu repensasse a minha vida e as formas que uso para administrar situações emocionais. Me vi um tanto rígida e controladora, incapaz de lidar com o diferente. Resolvi dar uma chance ao destino. Acho que vou procurar meu antigo amor! Talvez ele também tenha me reinventado! Ser feliz envolve mudanças e riscos! QUEM SABE?
CENA DE UM CRIME (MEDO/BLOQUEIO EMOCIONAL)
Algumas vezes na vida a gente se assusta com certas sensações que se afloram! Nossa tendência é negar alguns registros emocionais, na tentativa de não sofrer dores, que ficaram recalcadas em nosso interno. Saber disso pode ser muito importante para a busca do equilíbrio energético e psicológico. Todas as nossas experiências de vida ficam registradas no sistema psico-corporal. As situações traumáticas são as mais importantes! Existe uma defesa tentando dificultar o acesso mental à elas. Dependendo do grau do bloqueio, fica muito difícil conhecer e expressar esse sentimento! Essa defesa foi desenvolvida com a função de evitar a dor e de reviver o trauma sofrido! Só que ele continua lá , bem guardadinho! Com o passar do tempo, essa contenção, inconsciente, pode alterar a qualidade de vida emocional, sem a gente perceber a razão. O caso de Mônica reflete bem o que está sendo descrito aqui! Uma mulher que tinha tudo para ser feliz! Bem amada pelo marido, que a enchia de mimos e carinhos, tentando adivinhar todos os seus desejos. Fazia de tudo para vê-la feliz ! Tinha uma vida financeira segura. Realizada profissionalmente. Conheci Monica, numa tarde de primavera! Eu estava em meu consultório, me preparando para dar uma caminhada, num sol delicioso, quando escuto a campainha e, abrindo a porta, vejo uma mulher visivelmente deprimida. Pedindo socorro! Sentindo o quadro emocional, me prontifiquei à atendê-la! Sentia vontade de morrer, dizia ela. Impotente, não conseguia se livrar do vazio interno que estava destruindo a sua vida. Falou que o início dessa sensação se deu numa noite, quente de amor, enquanto transava com o seu marido, por quem tinha muita paixão e atração! Durante a transa, o seu companheiro, muito empolgado, começou sussurrar ” coisinhas” em seu ouvido, apimentando o momento! Numa dessas”expressões picantes”, murmurou:- “VEM AQUI MENININHA DO PAPAI”! Naquele instante foi como se todo o seu corpo ficasse contraído. Sem vida! Num impulso ela gritou “CHEGA”! Caiu num pranto compulsivo! Seu marido ficou chocado com essa reação tão inesperada. Ele não sabia do abuso sexual que ela tinha sofrido na infância! Nunca contou essa história à ninguém, por ter sofrido severas ameaças. Bloqueou em seu coração, muito medo e insegurança.! Houve um mecanismo que apagou esse trauma de sua mente. Mas, naquela noite, enquanto fazia amor, a frase que ouviu despertou todo o pavor que ficou contido por tantos anos. Depois disso, ela ficou totalmente desestruturada emocionalmente, entrando em depressão! Seu casamento entrou numa crise brava! Ela, assim como seu marido, não tinha noção porque passou a se sentir tão mal assim! Não queria mais nenhum contato íntimo! Começou a se fechar em si mesma! Foi ficando contraída e apática, chegando a sentir nojo de seu companheiro! Tomou calmantes na tentativa de resgatar sua identidade. Não melhorou! Esse quadro emocional não dava mais pra suportar! Pensou até em suicídio! Naquela tarde de setembro, de algum jeito, a vida soprou mais forte! Talvez o sol daquela tarde, tenha aquecido seu coração e fez com que ela viesse buscar ajuda. Queria sair daquele drama. Queria viver! Iniciou um processo terapêutico onde, paulatinamente, foram surgindo sensações da violência vivida! Compreendeu que as ameaças e sensações blindadas dentro de si, não poderiam continuar destruindo a sua vida emocional. Trabalhando o seu interno foi percebendo que quando criança, foi sim, vítima de um homem doente, criminoso! Não teve escolha! Como adulta, no entanto, já tinha discernimento para saber o que queria e o quanto poderia se cuidar! Não iria continuar sofrendo pelo crime que não cometera! Foi se desfazendo de sentimentos destrutivos que trancaram sua alma numa prisão. Começou a focar o que tinha de bom em si. A culpa e o perdão foram abrindo espaço para o resgate da menina alegre e feliz. Hoje, ela já não é mais, prisioneira de um crime!