A SEMI LOUCA ! (NEGAÇÃO)

Sou Maria. Nasci negra e linda, há vinte e cinco anos! Cresci numa família amorosa e com muito contato afetivo. Minha mãe, uma pessoa forte, charmosa e negra, assim como eu, foi o meu modelo de mulher! Soube fazer na vida tudo aquilo com que sonhou. Meu pai, um alemão alto e bonito, de olhos azuis, sempre foi apaixonado por ela. Viviam aos beijos, mesmo estando juntos há tantos anos. Pareciam recém-casados! As pessoas  sempre falavam que eles eram “almas gêmeas”. Realmente ela teve muita sorte de ter encontrado o Amor de sua vida, ainda muito jovem. Imaginem vocês, ela engravidou com apenas dezessete anos. Uma menina! Meus avós, seus pais adotivos, seres humanos maravilhosos, queriam muito que ela completasse os estudos. Se preocupavam muito com o seu futuro. Não queriam vê-la casada tão cedo. Mas não teve jeito! Voluntariosa e determinada, decidiu assumir a sua gravidez e o homem de sua vida! Eu soube, através das histórias que a família contava sobre meus pais, que eles tiveram muitas dificuldades no início do seu casamento. Meu pai, também jovem, vinte e dois anos, ainda nem tinha completado a universidade. Dava aulas de matemática para eles sobreviverem. Minha mãe, mesmo comigo bebê, deu continuidade aos seus estudos de pedagogia. Formou-se e foi crescendo profissionalmente. Mesmo assim ela arranjava tempo para estar muito presente em minha vida.  Lembro que, quando eu era menina, a gente brincava juntas, de boneca, como duas crianças. Era tão bom! Quantas saudades! Nossa, ela era uma pessoa tão natural, intensa! Seus olhos expressavam a alma. Fui crescendo. Fiquei a cara dela. Só herdei o sorriso de meu pai.  Parece que deu certo. Sempre gostei de olhar no espelho e me sentir o máximo!  Quanto ao meu pai, fez muito sucesso na engenharia, carreira que seguiu com competência e determinação.  Se resolveu profissionalmente. A única coisa ruim eram as longas e constantes viagens profissionais. Eu e minha mãe  sentíamos muito a falta dele. Minha mãe contava os dias. Quando ele retornava, era uma festa! Ele também chegava com a alegria de um menino ! Porém, existem coisas que quero um dia perguntar à DEUS! Há cinco meses , em uma dessas viagens, numa noite chuvosa, recebemos um telefonema no meio da noite. Foi a notícia mais trágica que podia chegar.  Meu pai tinha sofrido um acidente na estrada e perdeu a vida!!! Enlouquecemos. A dor intensa desfigurava a minha alma.  Minha mãe desmaiou! Depois desse momento, me deu um “branco mental”. Fiquei sem ação. O meu mundo emocional se virou de cabeça para baixo. Desde de lá, estou tendo “transtorno de ansiedade”. Fico muito mal. Respiração acelerada.Tonturas que alternam com dores no peito.  Mal estar geral. Não me reconheço. Pensei que estava cardíaca. Os médicos me acalmaram. Estou indo a um psicólogo. A terapia está me mostrando que tenho que me reorganizar e continuar… Preciso me restabelecer! Ainda tenho uma negra maravilhosa, que, pela dor profunda, parece uma “semi- louca”. Ela nega a morte de seu Amor! Todos os dias, à noitinha, se arruma toda e senta na varanda. Espera que ele volte. Não quer ouvir ninguém. Não aceita nenhum tratamento. Só aceita o meu carinho! Depois de esperar até a exaustão, meio adormecida, consigo que ela vá para a cama, bem abraçada a mim. As nossas dores se cruzam por instantes! Tento sair rapidamente desse estado emocional, antes que eu também fique na varanda à espera de meu pai!!!

ESTIVE MORRENDO! (CASTRAÇÃO EMOCIONAL)

Desde criança, fui considerado muito sensível. Acho que foi por isso que minha mãe, mulher muito prática, tratou logo de resolver o problema do jeito dela, me internando num colégio de padres. Muito rigoroso. Com nove anos de idade, fui afastada de minha casa. Foi violento para mim!  Adorava brincar com meu gato, jogar botão com primo, sentir o cheiro das comidas que minha mãe fazia. Tudo  foi arrancado  de mim, abruptamente. Ninguém quis saber qual era  meu desejo. Aliás, meu pai era um ausente. Não tinha voz para nada. Dominado pela minha mãe. Ela  quem controlava tudo. “Criança não tem querer”! Dizia que disciplina rígida é construtiva. “Eu iria amadurecer mais rápido e não choraria mais como menininha”. Ela foi cruel comigo! Não considerou meus anseios, meus temores e o quanto eu sentiria sua falta. Me senti abandonado, rejeitado. Não teve jeito,  fui separado de minhas fontes de afeto!  Quando cheguei naquele seminário, estranhei tudo. Era tão frio! Vivi momentos terríveis Sobrevivi. Realmente, fui parando de chorar; e de expressar emoções! Paralelamente, desenvolvi um quadro mental muito rígido. Durante  noites mal dormidas,  angústias vinham em formas de medo intenso e insegurança.  Esse medo foi sendo encoberto por uma raiva intensa. “Senti muita rejeição”! Desenvolvi a necessidade de ser o melhor em tudo. Comecei a funcionar como um robô! Não havia mais espaço para o “SENTIR”. Fui me  enquadrando naquele ambiente frio e sem afeto. Passei a ocupar o primeiro lugar da escola toda.  Usava todo meu tempo com estudos e futebol. Arrasei! Me destaquei. Todos me admiravam e respeitavam. Eu parecia uma máquina humana! Meu ego se alimentou com o sentimento de orgulho. Sobrevivi! O tempo foi passando. Minha mãe, muito ausente por todo aquele período.  Fazia visitas bimestrais ou trimestrais. Eu sofria calado. Imensas angústias em formas de pesadelos, intercalando com períodos de depressão! Me tornei extremamente competitivo. Com todo esse sucesso, fui convidado a escrever peças para o teatro de lá. Adorei! Aproveitei a chance para soltar “meus demônios” internos.  Fui me expressando.  Transgredindo regras rígidas através  dos roteiros que desenvolvia para o teatro. Serviam como válvula de escape dos meu conflitos. “Me transformei num transgressor de regras do internato”. Com dezessete anos fui expulso. Fui considerado uma ameaça aos valores daquela instituição. “Melhor notícia de minha vida”. Finalmente iria ter liberdade e seguir um caminho que fosse escolhido por mim. Saí daquele inferno! Nunca perdoei a minha mãe pelo abandono. Acho que ela nem percebeu! Vivia envolvida com valores externos e fúteis.  O status social sempre foi o que ela priorizou. Continuei com meus estudos, me formei em publicidade. Arranjei emprego. Dezenove anos, saí de casa. Hoje, aos trinta, sou profissional de publicidade, bem sucedido. Ganho dinheiro suficiente para ter conforto. NÃO SOU FELIZ! Nunca me apaixonei por ninguém. Nem por homem! Nem por mulher! Muitas dificuldades, com afetos e vínculos. Há uns dois meses comecei a ter um pesadelo recorrente. Está me incomodando muito! No pesadelo, sou criança perdida num deserto, com frio e tremendo muito.  De repente começo a gritar desesperadamente. Acabo chorando muito! Acordo com taquicardia e suores frios. (Andei lendo, ultimamente, textos sobre a ansiedade). Acho que esse mal me pegou. Não ando bem emocionalmente. Quando alongo e respiro, sinto certo alívio no peito. “TALVEZ O HOMEM ROBÔ FAÇA AS PAZES COM O MENINO CHORÃO”!

O MOMENTO SEGUINTE!!!? ( NEUROSE)

Me chamo LOLA. Ando com a cabeça quente. Não sei se vale a pena continuar meu longo namoro com Ricardo. Estou cansada de tentar entender todas as neuroses dele. Ele vem de uma família muito repressora. A capacidade de expressão emocional foi bloqueada e só foram alimentados valores externos, desconectados do “EU”. O foco era crescer no profissional, tornar-se uma pessoa importante e ganhar muito dinheiro. Como se isso bastasse para alguém ser feliz! No começo do nosso namoro, não consegui perceber o quanto ele era rígido, crítico e destruidor de felicidade. Entendo que ele foi uma vítima, mas decidi que não quero me tornar vítima também. Quando a nossa intimidade aumentou, emergiu esse ser neurótico, desprovido de sentimentos de carinho e respeito, esperados do homem que se ama. Estive tentando ser companheira, compreender, amenizar e superar conflitos. Sempre esperava mudanças de sua atitude, extremamente agressiva, com reações desproporcionais aos fatos do dia a dia. Meus sentimentos pediam pra reconsiderar cada briga, esperando que ele melhorasse. Estou num momento emocional que busca integrar coração com razão. Toda vez que desculpo o Ricardo de suas grosserias infundadas, sinto que me saboto e engulo seco mais outra mágoa. Não adianta os momentos de sexo quente e suas juras de amor eterno. Me cansei. Estou perdendo minha identidade. Não dá mais! Estive pensando que, se eu continuar a alimentar esse padrão de relacionamento, estarei tão desequilibrada quanto ele. Entendi que a base de toda relação saudável deve ser o respeito e a cumplicidade. Divergências de opiniões e posturas fazem parte! Desrespeito ao outro, nunca! Vai matando a paixão. Me ajudaram muito algumas leituras, comprovando que o desgaste emocional constante pode diminuir nossa imunidade trazendo doenças emocionais ou físicas. Ponderando entre o Amor que ainda sinto pelo Ricardo e as Mágoas dessa nossa relação, penso em lhe propor a última chance e tentar preservar a nossa união. “TERAPIA DE CASAL”. Se ele concordar, talvez a gente veja novamente juntos o ipê amarelo florir!

VIOLÊNCIA DOMÉSTICA! ( MACHISMO/COVARDIA)

Sou Cláudia, psicóloga. Exerço a função de psicoterapeuta num grupo de trabalho social que cuida de mulheres, vítimas de violência masculina, dentro de suas casas. Os casos de agressões absurdas que chegam até mim revelam uma enorme falta de equilíbrio, amor e respeito. A grande maioria desses “machistas” foi também vítima de pais também machistas. Eles ensinaram, pelas próprias atitudes, que esse modelo fortalece um homem! Esses filhos também sofreram muito! De algum jeito, cada um deles teve a sua primeira natureza bloqueada.Tiveram que desenvolver padrões de caráter alterados e doentios, acreditando que, assim, seriam fortes e admirados. Os valores primordiais do ser humano que correspondem à sensibilidade, empatia e generosidade ficaram recalcados em algum ponto de seu interior. Semana passada chegou até mim a jovem BETH, trinta e dois anos, mãe de um bebê de nove meses, casada com LUIZ, homem socialmente gentil, muito simpático e brincalhão. Na intimidade, “um monstro”! Ela relatou que, simplesmente, era submetida a torturas psicológicas e físicas, sempre que ousava não concordar com ele, em qualquer situação. Beth, durante a sessão, enquanto falava de seu sofrimento, ergueu a blusa e expôs marcas da mais recente violência de que foi vítima. Motivo banal: ousou atrasar o almoço do MACHÃO! Ele nem quis saber o motivo. Nem deixou ela explicar que o bebê deles tinha ficado a manhã inteira enfebrado, por causa de uma infecção na garganta. Ele tinha chorado muito. Só se tranquilizava sendo embalado no colo, com canções de ninar! Na hora em que seu marido chegou para almoçar, o neném tinha acabado de ser medicado e adormecera. Beth nem teve tempo de colocá-lo no berço. Luiz, descontrolado, não vendo a mesa posta, começou a vociferar palavrões, de baixo calão, ofendendo-a de todas as formas. Mal Beth tentou se explicar, ainda com o bebê no colo, recebeu um bofetão no rosto e caiu no chão com a criança. Teve o cuidado instintivo de o proteger com os seus braços! O bebê acordou super assustado, chorando muito. Nem essa cena abalou o desequilibrado marido. Estava como num surto. Não conseguia ouvir nada. Só sabia agredir, verbal e fisicamente. Como um monstro, pegou o filho do colo da mulher e o jogou no berço. Em seguida, despejou todo o ódio de uma vida em cima de Beth. Empurrou-a contra a parede, arrastando-a pelo cabelo, até o fogão. Dizia que ali era o lugar dela. Nem o ” TOTÓ”, o cãozinho que presenciava tudo, foi poupado. Num gesto brutal, o “machão” deu-lhe um pontapé no traseiro. O pobre cachorrinho correu dali, chorando muito. Depois deste filme de terror, o insano LUIZ saiu de casa deixando dores, choros e gemidos, como se nada tivesse acontecido. Sempre contou com o silêncio e o medo de Beth.  Desta vez foi diferente. Decidida a não passar nunca mais por essa situação criminosa, enfrentou seus medos e foi direto buscar ajuda na justiça. Foi assim que a conheci. Saindo da nossa consulta, ela  prestou queixa na delegacia da mulher. Não iria mais se submeter ao seu algoz. Ele não sequestraria mais a sua identidade! Jurou nunca mais ser prisioneira dele e nem de ninguém. Emergiu uma nova mulher no momento em que ela reconheceu que “estamos onde nos colocamos”! A ampliação da consciência é o único canal saudável, que dá chance de buscar e desenvolver integração entre auto-imagem e auto-estima. Na verdade, a fragilidade de um machão troglodita emerge diante de uma mulher forte, que se ama e sabe o que deseja para si.