Todas as manhãs a mesma rotina. Pontualmente, sete horas e trinta minutos, lá estava eu passando pela praça da Avenida Joaquina. Arborizada, florida, linda! Alguns ipês amarelos também alegravam o caminho. Nos dias ensolarados havia mais encanto ainda. Presente dourado oferecido pela natureza ! Essa alameda ficava bem pertinho da biblioteca onde eu trabalhava como bibliotecário. Assim que me formei, conquistei esse emprego. Foi festa. Grande sonho daquele momento de vida! Sentia tanto prazer no trabalho que nem percebia o tempo passar. Adorava ler sobre plantas e suas diversidades e todos os temas ligados à agricultura. Sempre buscava novidades sobre esses assuntos. Ali havia grandes obras. Sentia-me afortunado. Um verdadeiro privilegio. Assim que surgia um tempinho, aproveitava e ia correndo procurar lançamentos interessantes. Num desses momentos, folheando um livro relacionado à diversidade da “Floresta Amazônica”, considerada a maior biodiversidade do planeta. Muito absorto e surpreso com a citação das milhares de espécies de plantas, mamíferos, anfíbios, pássaros e peixes. Distraído, folheando as páginas, ouvi uma meiga voz, dirigindo-se a mim. Desfoquei minha atenção! Levantei a cabeça e avistei uma figura iluminada. Indagou- me sobre referências recentes do tema que eu estava folheando. Esboçando um sorriso pela coincidência, entreguei-lhe o livro. Era uma tarde de quinta feira. Primavera! Sol ameno invadia as janelas da biblioteca. Foi assim que conheci “Esperança”! Estudante de agronomia. Mais ou menos vinte e cinco anos de idade. Introspectiva. Rosto sério. Cara de intelectual. Num cenho acentuado, as sobrancelhas moldavam um par de olhos extremamente expressivos e sonhadores. Seus olhos, ainda que doces, escondiam um jeito rígido de ser. Não se encaixavam naquele rosto de expressão tão séria. Hoje, passado quatro meses, entendo diferente aquela expressão rígida! Por trás daquela rigidez e introspecção, se escondia uma menina insegura e sonhadora. Era sua defesa! Talvez tenha tido uma educação severa. Quem sabe! Esperança era linda. Cabelos longos e cacheados, de um castanho brilhante. Tinha o hábito de jogá-lo para trás com as mãos, enquanto eu puxava conversa com ela. Era um charme! Começou a frequentar a biblioteca. com assiduidade. Adorava o momento em que ela chegava. Eu fantasiando cenas incríveis entre nós. Ela nunca baixou a guarda. Inacessível! Acho que esse fato me excitava ainda mais. Quantos sonhos noturnos invadidos por Esperança! Fiquei viciado em aguardar sua chegada todas as quintas feiras, à tarde. Parecia que ela e os ipês entravam juntos. Tanta luminosidade. Tamanha a energia, colorindo minhas emoções! Menina mulher emanando perfume agridoce, aromas que mexiam em meus desejos inconfessos. Essa contradição entre seu olhar e atitude tornou-se um mistério envolvente. Apaixonei-me, perdidamente, por aquela menina. Até meio obsessivo. Já não era normal pensar nela do jeito que eu pensava. Vinte e quatro horas por dia. “Eu era Esperança”. Brigava comigo mesmo com raiva daquela dependência emocional que controlava os meus sentidos, sem receber o menor retorno de Esperança. “Quintas feiras virou paranoia”! Acordava feliz. Tomava um banho cheiroso. Escolhia uma roupa que encaixasse com o colorido daquele dia. Treinava expressões sedutoras frente ao espelho, para conquistar Esperança. Queria aquela menina para mim! Assim, o tempo foi passando. Eu sonhando como um adolescente. Até que numa quinta feira quente, início de verão, Esperança não chegou. Gelei! Fiquei angustiado! Ansioso. Esperei-a em todas as quintas seguintes. Qual nada! Esperança sumiu. Sem deixar rastros. Sofri a perda de uma grande paixão. Pensei em morrer. Saudades de seu olhar triste e sonhador. Foi cruel ter sonho destruído. Dia destes, num repente, enquanto trabalhava, senti seu cheiro passeando por lá. Meu coração disparou. Corri como um doido até o cantinho em que ela gostava de ler. Decepção inconsolável. Até duvidei de mim. Será que enlouqueci? Seria fruto de minha imaginação? Não havia nem sombra dela. Só que sentia o aroma agridoce emanando daquele canto. Sei lá. Ultimamente a saudade anda me intimando:- CORRE ATRÁS DA ESPERANÇA SENÃO TE MATO!