AMOR E PAIXÃO (CONFLITO).

Domingo. Saboreando uma taça de vinho tinto, na ampla  varanda de meu apartamento, frente ao mar. Raro momento, mesclado de prazer e saudade. Certa nostalgia no ambiente. Raios faiscando no horizonte e um mar violento como pano de fundo. Ondas gigantes. Assustadoras. Aqui, eu e meus pensamentos. Torturantes. Infiéis e traiçoeiros. Malditos pensamentos! Chegam sem serem convidados, abalando a aparente harmonia que insisto transparecer real. Coisas do meu racional. Tremendo rochedo que não deixa vazar quase nada do que sinto. Quase! Batida de maracujá consegue enfraquecer esse rochedo! Sozinho, sentado na poltrona verde musgo comprada há anos, poucas semanas antes do casamento. Em meio a correria do casório resolvi ir até Itatiba, cidadezinha próxima, onde havia ofertas de excelentes móveis. Assim que avistei aquela poltrona no canto da loja, logo de cara, me apaixonei. Verde foi sempre minha cor favorita. Tinha um design perfeito. Feliz, arrumei meu ninho, como um “bem te vi” apaixonado pelo canto em que iria morar, enfeitiçado por aquela pessoa que tinha encantado a minha vida tão profundamente. Quantas loucuras! Devaneios malucos. “Travessuras de crianças”. Quantas! Tudo tão perfeito. Dava medo de tanta felicidade; porém, o senhor tempo, poderoso e transformador, trouxe alterações. Com certeza, lições importantes, também. Temo que eu não tenha sido bom aluno. Os anos foram se passando. Do fogo, restou fumaça. Densa. Escura. Algumas vezes colorida. Não percebi que mudanças lentas, quase imperceptíveis, foram deixando buracos internos e um vazio angustiante no coração. Instinto de vida reagiu, fortemente, fundamental aos sentidos, na busca da sobrevivência. Faltava pulsação dentro de mim! Precisava sentir motivação pela vida. Foi então que inconscientemente acolhi uma nova pessoa em meu coração. Chegou, sem pedir licença. Ancorou-se. Foi construindo um mundo colorido que  nem lembrava mais existir. Nutriu tanto! Fortaleceu sentimentos anêmicos, quase falidos. Nova vontade de viver. Fui ancorando num quadro emocional ambivalente, cheio de altos e baixos. Muitas vezes o diafragma aperta exageradamente. Inspiro fundo e vou levando a vida sentada na mesma poltrona verde, onde bem-te-vis nem fazem mais questão de alimentar os antigos sonhos. Ao mesmo tempo, novas âncoras emocionais estimulando meus sentidos, trazendo vida e colorido. Culpa? Sempre! O mar sabe bem de minhas histórias. Sempre ouve meus queixumes apaixonados. Indecisos. Neste início de tarde, raios no céu turquesa, assustando pela beleza e força, tocaram meu fogo interno. Tão forte! Conseguiram desestabilizar a rígida estrutura psíquica que montei pra me enganar. Neste estado vulnerável, num repente, ouço uma voz companheira e amorosa, chamando:- AMOR, O ALMOÇO ESTÁ NA MESA!

CASAMENTO RECORRENTE! (TENTATIVA).

Equilíbrio mental? Impossível, naquele contexto. Idealizei uma relação com um cara que nunca existiu. Só tinha vida em minhas fantasias. Aliás, fantasias muito caras. Preço alto a pagar! Bagunçaram toda a minha estrutura psicológica. Perdi a identidade. Esqueci de mim. Durante anos aquele homem vulcão soltou lavas queimando e devastando o meu bom senso e amor próprio. Fui me transformando numa pessoa fria e esquisita. Perdendo a sensibilidade e alegria de viver. Enrijeci! Desenvolvi couraças protetoras, alterando a minha primeira natureza. Sergio Ricardo conseguiu! Identifiquei-me com a sua casca de crocodilo. Ficamos iguais! Comecei a viver a vida de forma prática, assim como ele. Fui seguindo sem olhar para trás. Pedi o divórcio! Sai do relacionamento tóxico. Precisava ser feliz. Iniciei um novo caminho levando as sequelas da toxicidade vivida com aquele homem. Dores de estomago. Zumbido na cabeça. Ansiedade! Fragilizada e assustada, busquei tratamentos naturais. Chás caseiros aos montes. Alongamentos, respiração e meditação. Iniciei alimentação vegetariana. Precisava reequilibrar o psicológico e o meu organismo. Estresses vividos foram intensos e danosos. Depois de uns tempos finalmente voltei para mim. Fazendo muitas reparações. No meu ritmo, fui resgatando valores perdidos. (Sensação incrível sentir-se conectada consigo mesma). Voltei a frequentar minha antiga turma da faculdade. Sair para dançar. Beber com amigos. Esqueci dores passadas. Percebi que a vida pode ser trágica e cômica. Senti isso na pele! O Halloween, trinta e um de outubro, foi realmente a noite das bruxarias em minha vida. Distraída, dançando, vestida de “Dama da noite”, percebi um zorro alto e esguio do outro lado do salão. Olhos fixos em mim. Desviei várias vezes do insistente olhar. Na medida em que disfarçadamente foi se aproximando, notei um verde muito intenso naqueles olhos risonhos. Mistura de energia e sedução foram se intensificando. Num milésimo de segundo, senti minhas defesas se afrouxarem. Desde que tinha terminado o relacionamento com Paulo Henrique, há dois anos e meio, aquela era a primeira vez que sentia atração novamente por alguém. Me estranhei. Resisti. Não sabotei a sensação maravilhosa que me envolvia. Estava carente daquela emoção. Sorrindo, dei boas vindas à vontade de viver. Abri meu melhor sorriso! Na medida que os olhos verdes foram se aproximando senti certa familiaridade com a expressão e a figura daquele zorro. A fantasia que ele usava camuflava traços físicos. Mas o olhar… Frio na barriga antigo se intensificou! Encoberto por sua capa preta e máscara aproximou-se, descaradamente, envolveu-me pela cintura. Saímos dançando feito loucos. Quando me dei conta estávamos girando muito no centro do salão. Tudo tão rápido. Tão mágico. Eu era a rainha da festa naquele momento! A mais linda e desejada. Assim que me sentia! Depois de muitos giros e danças, a música foi se acalmando, lentamente, até que pausou. Sei lá, “PAULO HENRIQUE SOUBE FAZER DO INTERVALO UMA NOVA SEQUENCIA”! RECAÍDA?